Dieta e melanoma, existe relação?

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Melanomas são causados por fatores individuais, que dependem da genética do indivíduo, e fatores comportamentais. Pele clara, pele que se queima com facilidade e tem dificuldade para se bronzear e presença de múltiplos sinais ou pintas são fatores individuais. Enquanto exposição solar intensa é um fator comportamental. Além da exposição solar, outro fator comportamental começa a ter importância nos casos de melanoma: a alimentação.

Estudos demonstram que dietas mais saudáveis, ricas em fibras, compostas por alimentos não processados ou ultraprocessados, dietas ricas em ácidos graxos poli-insaturados (ômega 3 e 6) e monoinsaturados (azeite de oliva) e também, ricas em antioxidantes parecem ter um efeito protetor em relação ao surgimento do melanoma.

Além disso vários estudos relacionam a microbiota intestinal com melhor resposta de pacientes com melanoma aos tratamentos de imunoterapia.

Apesar de tudo isso, nenhuma dieta ou suplementação nutricional é capaz de curar um melanoma, algo que é infelizmente anunciado nas redes sociais e na internet.

Prevenção do melanoma por meio de alimentação saudável

Vários alimentos ou dietas tem sido apontados como tendo efeitos preventivos, reduzindo o risco do surgimento do melanoma.

  • Cafeina: Alguns estudos relacionam o consumo de cafeína com menor risco de melanoma, consumir acima de 3 doses de café ao dia parece ter um efeito protetor. É importante salientar que pode haver um fator de confusão nesta associação, afinal quem trabalha em escritórios, com menor exposição solar também consome mais café.
  • Vitamina D: Níveis mais altos de vitamina D sérica são associados a menor risco de desenvolver melanoma e a melanomas mais finos, com menor índice de Breslow. Contudo, estudos iniciais com suplementação de vitamina D ainda não demonstraram benefícios na prevenção do melanoma.
  • Dieta mediterrânea: Uma dieta rica em vegetais, legumes, frutas e azeite com consumo moderado a baixo de peixes, carnes, laticínios e açúcar. A dieta mediterrânea se relaciona a um menor risco de câncer, vários tipos de câncer, incluindo melanoma.
  • Frutas, vegetais e fibras: Fibras são carboidratos não digeríveis (não são digeridos nem absorvidos pelos seres humanos) derivados de plantas. Dietas baseadas em consumo de vegetais, frutas e fibras são usadas na prevenção de pressão alta, por isso conhecidas como DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension). Dietas DASH mostram um efeito protetor em mulheres abaixo de 50 anos, talvez relacionado a um efeito hormonal de estrogênios.
  • Cúrcuma: Também conhecida como açafrão da terra, a cúrcuma tem sido apontada recentemente como protetora para uma série de doenças, em especial para vários tipos de câncer. Estudos pré-clínicos (em animais) mostraram um efeito protetor da cúrcuma em relação ao melanoma. Contudo, a cúrcuma tem baixa biodisponibilidade e pode conter elementos tóxicos, sendo necessário cuidado com seu uso.

Mas nem todos os alimentos tem efeitos positivos. Algumas comidas ou esquemas alimentares são associados a um maior risco de melanoma.

  • Álcool: Estudos demonstram que álcool é um fator de risco para melanoma. O álcool parece causar um dano oxidativo ao DNA. Quanto maior o consumo maior o risco, mas não existe quantidade segura, mesmo consumo moderado a leve aumenta o risco.
  • Obesidade: Estima-se que 20% de todos os cânceres estejam relacionados à obesidade. No caso do melanoma a maioria dos estudos mostram que obesidade seria um fator de risco, mas existem estudos com resultados opostos.
  • Carga Glicêmica: O consumo excessivo de doces, açúcares e farinha branca está associado a um aumento de risco de melanoma, mas também de câncer de mama e câncer de colón.
  • Frutas cítricas: Um maior consumo de vitamina C através de alimentos tem sido relacionado a um maior risco de melanoma. Os resultados são conflitantes, com outros estudos não mostrando risco. Talvez seja um efeito de confusão parecido com a cafeína, pessoas com maior ingesta de frutas cítricas tem maior exposição solar, e o sol seria o responsável pelo risco e não a vitamina C.
  • Carnes vermelhas e carnes processadas: Carnes vermelhas e carnes processadas são relacionadas a um aumento de risco de câncer de colón, câncer de estômago e câncer de próstata. Em relação a melanoma parece haver um aumento de risco para carnes processadas, mas de forma conflitante existe um efeito protetor de carnes vermelhas. Este possível efeito protetor tem sido atribuído aos retinóides (derivados de vitamina A) presentes na carne vermelha.  
Quais alimentos podem aumentar o risco de melanoma? Quais tem efeito protetor?
Alimentos e o risco de melanoma

Importância da microbiota intestinal na resposta ao tratamento do melanoma

Houve uma revolução no tratamento do melanoma depois de 2012 com a introdução de 2 novos tratamentos: terapia alvo e imunoterapia. Na imunoterapia existe um estímulo ao sistema de defesa para combater o melanoma. Os resultados são muito bons, contudo, por volta de 50% dos pacientes não respondem ao tratamento ou tem respostas aquém do esperado. Vários estudos atuais relacionam a microbiota intestinal a uma resposta melhor à imunoterapia. Diversas espécies de bactérias têm sido apontadas como responsáveis por uma melhor resposta aos tratamentos com imunoterapia. Estas espécies de bactérias quando transplantadas de um paciente que respondeu ao tratamento para um paciente que não respondeu ao tratamento, promovem um aumento da taxa de resposta à imunoterapia, mostrando a relação direta das bactérias com o tratamento de imunoterapia.

Mas, o que isso quer dizer na prática? Por enquanto nosso entendimento sobre microbiota intestinal e melanoma ainda está restrito a estudos, com pouca aplicabilidade prática. Por mais que exista uma relação e se conheçam as bactérias que melhoram a resposta, ainda não está indicado o uso rotineiro de suplementação microbial em pacientes com imunoterapia. Existem estudos em andamento para avaliar esta estratégia. Uma outra abordagem interessante é o transplante de microbiota fecal. Uma suspensão fecal de um doador é preparada e administrada via sonda nasoenteral, enema, colonoscopia ou por cápsulas. A idéia é levar a microbiota de um doador que respondeu ao tratamento com imunoterapia para um paciente que não teve resposta. Os primeiros estudos mostraram resultados interessantes. Estudos maiores estão em andamento e futuramente saberemos mais sobre esta estratégia.

Considerações finais

Como podemos ver, existe muita dúvida ainda. São necessários mais estudos para que possamos entender exatamente como a alimentação impacta no surgimento e no tratamento do melanoma. Mas, é certo que existe uma relação entre alimentação, microbiota intestinal e resposta aos tratamentos do melanoma. Desta forma não existe uma recomendação para uma dieta específica. Recomenda-se evitar o consumo exagerado de álcool, manter uma dieta equilibrada e rica em fibras e evitar a obesidade. Por enquanto os estudos não respaldam o uso de suplementação nutricional para a prevenção ou tratamento de melanoma.

Referências bibliográficas:

  1. Kumar P, Brazel D, DeRogatis J, Valerin JBG, Whiteson K, Chow WA, Tinoco R, Moyers JT. The cure from within? a review of the microbiome and diet in melanoma. Cancer Metastasis Rev. 2022 Jun;41(2):261-280
  2. Pellegrini M, D’Eusebio C, Ponzo V, Tonella L, Finocchiaro C, Fierro MT, Quaglino P, Bo S. Nutritional Interventions for Patients with Melanoma: From Prevention to Therapy-An Update. Nutrients. 2021 Nov 11;13(11):4018.
  3. DeWane ME, Shahriari N, Grant-Kels JM. Nutrition and melanoma prevention. Clin Dermatol. 2022 Mar-Apr;40(2):186-192

Autor:

Dr. Gustavo Alonso

Dermatologista – CRM – SP: 97410 | RQE – 37815