Câncer e obesidade
A obesidade está relacionada a 20% de todos os cânceres, sendo o segundo fator de risco prevenível (causas de câncer que podem ser prevenidas por mudanças de hábito) atrás somente do tabagismo. A obesidade aumenta o risco do surgimento de câncer, além de piorar sua evolução e aumentar a mortalidade.
Como a obesidade atua no câncer
A obesidade aumenta o risco de câncer e piora sua evolução através de uma série de mecanismos que acontecem simultaneamente, são eles:
- Aumento de inflamação: a obesidade promove inflamação crônica que por sua vez favorece o aparecimento e o crescimento de células cancerígenas.
- Aumento de fatores de crescimento, especialmente fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1): na obesidade existe resistência periférica a insulina, aumento de secreção de insulina e aumento de IGF-1
- Alteração dos hormônios sexuais: o tecido adiposo funciona como um órgão endócrino, capaz de secretar hormônios. As células adiposas secretam aromatase, uma enzima que metaboliza hormônios sexuais masculinos em hormônios femininos, aumentando os níveis de estrogênio.
- Aumento de adipocinas (proteínas secretadas pelo tecido adiposo) especialmente lepitina, que promovem o crescimento tumoral e a inflamação. Lepitina parece estar particularmente ligada ao melanoma, aumentando seu crescimento através de angiogênese e diminuindo as respostas de defesa do organismo por inibir o gene p53.
- Alteração do microbioma intestinal, com aumento de espécies de bactérias que causam crescimento tumoral como fusobactérias
- Alterações mecânicas da obesidade: o aumento de peso e o volume de gordura diminuem a mobilidade, restringindo a capacidade física
- Aumento dos vasos sanguíneos: a obesidade favorece a angiogênese, a formação de novos vasos sanguíneos, que favorece o crescimento do tumor, além de facilitar as metástases.
- Diminuição de vitamina D: Vitamina D é importante fator na prevenção de alguns tipos de câncer, em pessoas obesas é comum encontrarmos níveis baixos de vitamina D, por sequestro da vitamina D pelo tecido adiposo.
- Comunicação entre as células do câncer e o tecido adiposo: este mecanismo é muito importante no melanoma e no câncer de mama. O tumor consegue alterar as células adiposas ao seu redor, facilitando a invasão dos tecidos e as metástases.
Melanoma e obesidade
A obesidade tem uma influência grande no melanoma, começando pelo aumento no risco de desenvolver melanoma. Estudos mostram que homens obesos tem maior risco de desenvolver melanoma. Inicialmente os estudos não mostravam o mesmo risco em mulheres. Mas aqui existe um fator de confusão: a exposição solar. Mulheres obesas, por questão de vaidade se expõe menos ao sol. Quando os estudos foram “corrigidos” levando em conta exposição solar, o aumento de risco de melanoma também foi evidenciado em mulheres obesas.
Além de um maior risco de desenvolver melanoma a obesidade se associa a tumores mais agressivos com maior risco de invasão e metástases. Pacientes obesos tendem a apresentar melanomas com maior índice de Breslow, melanomas mais espessos.
O paradoxo da obesidade
Apesar de muitos estudos relacionarem a obesidade com maior risco de desenvolver melanoma e também com melanomas mais agressivos, com maior chance de metástases, alguns estudos relacionam obesidade com melhor prognóstico no melanoma. Ou seja, pacientes obesos quando diagnosticados com melanoma tendem a ter um melhor prognóstico do que pacientes não obesos. Por isso os dados ainda são conflitantes.
Como prevenir a pior evolução do melanoma pela obesidade?
Pacientes com melanoma que tenham obesidade, e até mesmo sobrepeso, devem ser orientados a comer de forma mais saudável. PArece existir uma relação muito grande entre alimentação e resposta do melanoma aos tratamentos. Uma dieta adequada vai levar não somente a perda de peso, mas também ao reestabelecimento de uma biota intestina.
Além da dieta é fundamental a prática de exercício físico regular. Ainda existe muito receio dos pacientes com câncer a respeito da prática de atividade física, mas os estudos mais recentes comprovam que atividade física regular, 4 vezes por semana, com intensidade adequada (não pode ser exercício muito leve) melhora o prognóstico do câncer. O benefício da atividade física se da em parte por contrapor os efeitos da obesidade, como aumento de insulina e lepitina.
Pacientes com melanoma devem se alimentar de forma saudável, evitando o sobrepeso e a obesidade. E devem praticar atividade física de forma regular, sempre evitando a exposição solar intensa durante a atividade física.
Referências bibliográficas
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